Escrever a sua vida… Para começar, é preciso esclarecer qualquer mal-entendido. Este livro não é um manual para aprender a transformar uma vida comum em um relato apaixonante. Tampouco é um método para saber como dar mais emoção à existência, com o objetivo de ter algo para contar aos netos algum dia. É, simplesmente, uma autobiografia, ou mais exatamente, uma autoficção, já que relatar a própria vida é, no mínimo, revisitar, e até reinventá-la. Um dia, tomava café com um vizinho e comecei a contar-lhe um episódio da minha vida. Ele me olhou com os olhos bem abertos e, após algum tempo, sabendo que sou escritor, interrompeu-me: “Mas é verdade o que estás a contar-me, ou estás a inventar à medida que vais contando?” Confesso que, por um breve instante, eu próprio tive minhas dúvidas. Claro, todos os escritores são mentirosos, mas também às vezes mentem de verdade, para retomar a fórmula de Aragon. Isso foi o que me decidiu a escrever este livro. Sim, este relato está escrito em primeira pessoa, para contar a minha verdade. Toda a minha verdade? Nada além da minha verdade? Não juraria. Acontece que sou escritor. Conto neste livro como cheguei até aqui, sem me apresentar como um exemplo a seguir para quem queira se tornar autor também. Escrever a própria vida é, antes de tudo, reivindicar essa parte de liberdade que só a sensação de estar vivo proporciona. Conquistei a minha liberdade através da escrita, que também é uma forma de libertação. Mas pode-se escrever a vida de muitas maneiras, com atos mais do que com palavras. Aqui está como tentei escrever a minha. Escolhendo de preferência, como o viajante de Robert Frost, os caminhos menos transitados.